A mais perigosa é a restrição ao uso do reverso
A meta adotada pela Gol para economizar combustível depois de um
prejuízo de R$ 1,5 bilhão em 2012, que tem como objetivo reduzir os gastos, pode
trazer riscos aos voos da empresa, apesar de a própria negar a insegurança.
Descidas diretas, desativação do reverso, desligamento de um
motor e a
realização de rotas mais diretas para conter os atrasos das decolagens são
algumas das ações da empresa na busca pela economia.
O uso do reverso – equipamento que ajuda o avião a frear –, por exemplo,
apesar de ser opcional em determinadas pistas mais longas, é “obrigatória
nas pistas curtas, também chamadas de pistas críticas”, segundo informou o
comandante Carlos Camacho, diretor de Segurança de Voo do Sindicato Nacional
dos Aeronautas (SNA). Apesar disso, o não acionamento do reverso é uma das
medidas recomendadas pela Gol para contribuir com a redução do gasto de
combustível.
Já o tenente-brigadeiro-do-ar, Mauro Gandra, – também ex-ministro da
Aeronáutica no governo Fernando Henrique Cardoso, de 1995, e atual diretor
do Instituto do Ar da Universidade Estácio de Sá –, afirma que a medida mais
arriscada entre as descritas no informe da Gol seria o não acionamento do
reverso. “Quando você tem uma pista mais curta, por exemplo, como a do
aeroporto de Congonhas, dificilmente um
piloto vai deixar de usar o reverso se
precisar dele. Agora, no Galeão, ou em Brasília, pode deixar de utilizá-lo
tranquilamente”, compara o tenente-brigadeiro-do-ar.
Incentivo do bônus divide
opiniões
Entretanto, para Carlos Camacho, o fator que mais preocupa a classe é a
oferta de um bônus aos
pilotos. “[A conduta da Gol] nos preocuparia muito por
conta da [possibilidade de] bonificação individual, porque geraria uma espécie de
competição e aí poderia sim haver o risco, em função do programa de remuneração
do fim do ano. Mas sem estar individualizado, o sindicato diminui seu nível
de preocupação”, analisa o diretor de Segurança de Voo do SNA.
“O piloto que troca a vida dele por um bônus não é um piloto.
Não acredito que alguém, conscientemente, vá colocar em risco a própria vida e
a de passageiros por uma bonificação”, ressalta George Sucupira, diretor
presidente da Associação de pilotos e proprietários de aeronaves (APPA).
Outra
questão levantada por Camacho, no entanto, se refere à
imagem da empresa perante os seus funcionários, já que a atitude
beneficia
pilotos, por ser o começo do processo para ser um PRL (Participação nos
Lucros
e Resultados). Segundo o comandante, não é uma atitude positiva a
empresa “dividir
a lucratividade com os pilotos", alerta Camacho, esclarecendo que o
benefício deveria ser extensivo a todos os funcionários para evitar um
conflito desnecessário.
Brigadeiro prevê
possível revisão antecipada dos motores devido à medida
Com a redução do consumo de combustível, conforme avalia
Mauro Gandra, "a companhia pode se atentar, em longo prazo, para o fato de que no
fim, deve aumentar o número de horas de voos no motor, o que pode antecipar a revisão
destes. Mas esta é uma coisa quase que subjetiva. É preciso fazer uma análise muito
mais profunda”, interpreta o tenente.
Sobre as rotas diretas, o brigadeiro ressalvou apenas que a
medida pode não funcionar por conta de um intenso tráfego aéreo, mas, em geral, considera possível.
“Bolo cresceu mais
que a forma”, diz Carlos Camacho
“O que acontece no Brasil é que o bolo cresceu mais que a
forma”, critica o diretor de segurança aeronáutica. “A infraestrutura não dá
vazão para a aviação regular no país. Nós não nos preparamos para este bolo exponencial.
E é muito difícil correr atrás agora, apesar dos governos
estarem tentando”, reconhece o sindicalista.
“O que a Gol está fazendo não é diferente do que a Tam faz
com o plano Smart Fuel, e também a Trip, com a sigla IP, o índice de desempenho.
Na verdade, o que a Gol criou foi uma problemática salarial nessa fusão com a
necessidade de economizar combustível e a reconstrução dos pagamentos. Mesmo
caso da Azul, empresa que, segundo os pilotos, reduziu os salários e pede a economia de combustível”, diz o diretor.
Portar menos carga e peso nas aeronaves também já são
medidas adotadas, segundo Camacho, exemplificada pela retirada, inclusive,
dos alimentos a bordo, para diminuir o consumo do combustível dos aviões.
“Escala torna a vida
do piloto um inferno”, afirma diretor da SNA
O comandante Carlos Camacho aponta ainda que o maior
conflito na Gol hoje não é a meta de economia de combustível propriamente
dita, mas sim as medidas econômicas. “As
empresas precisam investir bastante no nível de satisfação das categorias. A
Gol começou a mexer nas escalas e parece que a grande jogada da empresa é que o
piloto não durma. A escala torna a vida de um piloto um inferno”, exclama o
profissional.
De acordo com o sindicalista, “a mudança de escalas leva o
tripulante a uma situação de absoluto desconforto e aumenta o nível de risco
presente na função”.
“A verdade é que a insegurança está presente onde há uma
tripulação infeliz, devido às escalas, onde há, por vez ou outra, o descuido.
Fora do avião, quem tem mais poder é o escalador. E a chefia está sempre do
lado da empresa. Nove em dez chefes não estão ao lado do trabalhador”, conclui
o comandante.
JORNAL DO BRASIL