Multiplus e Smiles adotaram
novas estratégias com o aumento da demanda provocado pela ascensão da
classe C, que tornou mais complexo o mercados de troca de pontos por
passagens
Com as mudanças do mercado, TAM e Gol transformaram seus programas de fidelidade em empresas independentes
(Reinaldo Canato)
Há alguns anos, as companhias aéreas tentaram fidelizar os consumidores
pelo bolso. Com programas de recompensa baseados em acúmulo de
milhagem, quanto mais o cliente voava, mais pontos ele teria para trocar
gratuitamente por passagens aéreas.
A mecânica era conhecida pelos
usuários de cartões de crédito, mas uma classe C ascendente descobriu os
encantos dessa aparente mágica do “juntou, trocou” com as companhias
aéreas. No início, Tam e Varig não tiveram problemas com seus
passageiros que lotavam aeronaves. Porém, o sucesso da fidelização
transformou o benefício.
Com número limitado de assentos por voo para
atender os usuários desses programas, as reclamações colocaram em xeque a
capacidade das empresas de atender seus clientes mais fiéis. A nova
realidade fez com que as empresas buscassem novas alternativas.
Os programas de pontuação das duas maiores companhias aéreas
brasileiras, a Multiplus, que pertence à TAM, e a Smiles, que atualmente
é ligada à Gol (que comprou a Varig), passaram a diversificar a forma
como os clientes podem acumular e resgatar os pontos por meio de novas
parcerias.
Atualmente, é possível adquirir pontos no abastecimento do
carro e na assinatura de revistas, além das tradicionais viagens e de
compras com cartão de crédito. Isso porque Multiplus e Smiles deixaram
de ser simples programas ligados às suas marcas criadoras e passaram a
ser empresas independentes das aéreas. Em abril deste ano, a Smiles
abriu seu capital
na Bolsa de Valores de São Paulo em uma oferta pública inicial (IPO, na
sigla em inglês) que captou 1,132 bilhão de reais.
Enquanto a Gol
enfrenta dificuldades para sair do prejuízo, os primeiros passos da
Smiles como empresa independente já mostram bons resultados. As ações
tiveram uma valorização de 10,6% desde o IPO e a empresa divulgou nesta
semana um lucro de
29,8 milhões de reais, registrado no primeiro trimestre do ano. Na mesma semana, a Gol anunciou um
resultado negativo de 75,29 milhões de reais, nos primeiros três meses de 2013.
A ideia da Gol de deixar a Smiles ter voo solo foi adotada há três anos
por sua principal concorrente no mercado doméstico, a TAM, que fez o
IPO da Multiplus em 2010. Desde o IPO, as ações da Multiplus tiveram uma
valorização de 146,8%, de acordo com levantamento da consultoria
Economatica.
Para o presidente da Smiles, Leonel Andrade, o mercado de
fidelização no Brasil ainda é muito incipiente e está bastante focado
nos cartões de crédito e nas companhias aéreas. Ele diz que no país
apenas 5% da população participa de programas de fidelidade como um
todo, mas que em lugares como o Chile, essa proporção é de 50%.
"O
Brasil tem uma baixa cultura de varejo para fidelidade. Temos poucos
programas de relacionamento forte." Contudo, Andrade acredita que o país
tem potencial para atingir de 15% a 20% nos próximos 4 a 5 anos,
explicando que a participação nesses programas de relacionamento tem a
ver com a maturidade dos mercados.
A estratégia de transformar os programas de fidelidade em empresas
independentes das aéreas obrigou esse novo negócio a atrair parceiros em
vários segmentos de varejo, como distribuidoras de combustível,
livrarias, editoras, hotéis e locadora de veículos.
A ideia é dar poder
de escolha para o consumidor trocar pelo que bem entender. Além, é
claro, de pagar a conta. Desses acordos vêm a remuneração das empresas -
que são guardados à sete chaves por eles. Além de um pagamento para
fazer parte da rede (que varia segundo a importância e o peso do
parceiro), todos os meses há um saldo a pagar ou a receber, dependendo
de quantos pontos foram gerados e quantos foram usados.
A Multiplus, por
exemplo, tem uma carteira de apresentação com 11,3 milhões de
participantes e 383 parceiros. O faturamento no primeiro trimestre deste
ano foi de quase 3,4 bilhões de reais.
Com o modelo de multifidelização, os consumidores acumulam pontos de
várias formas e podem trocá-los por uma infinidade de produtos e até
serviços, como cinemas e pagamento de pedágio.
De acordo com Eduardo
Gouveia, presidente da Multiplus, 66% dos participantes da Multiplus
acumulam pontos em diversos tipos de compras. "Somos uma rede de
parceiros que acumula pontos em um único lugar. Assim é possível
acumular pontos com maior velocidade e maior relevância", explica ele.
No entanto, as passagens aéreas continuam sendo as mais desejadas.
Segundo Gouveia, ainda que as empresas aéreas liderem os resgates -
cerca de 92% a 95% dos feitos por clientes Multiplus são convertidos em
passagens da TAM - , produtos como combustível, eletroeletrônicos e
hotéis são outros preferidos pelos clientes.
Como é difícil usar - Mesmo com a oferta de novos produtos, a conversão continua complicada para as passagens aéreas. O site
Reclame Aqui
tem diversos registros de clientes dizendo que os pedidos de conversão
de pontos que não foram creditados nas companhias aéreas.
A assessora
técnica do Procon-SP Marta Cassis faz alguns alertas para que o
participante desses programas não tenham dor de cabeça. Ela ressalta
que, antes de tudo, é preciso ler bem as condições de participação e,
principalmente, de trocas para evitar frustrações - que estão,
infelizmente, cada dia mais comuns. "A maioria das reclamações é sobre
as demoras para conversão de pontos e alterações que as empresas fazem
em seus programas", diz Marta. "O problema é que a maioria deles tem
regras complexas."
Com um número maior de beneficiados, as empresas mudaram nos últimos
tempos itens de sua política de acúmulo de pontos e, mais importante, de
validade. No início, o importante era acumular sem pressa.
Agora, quem
esquece os pontos na carteira pode ter uma surpresa desagradável. E o
fenômeno não se restringe apenas à Multiplus ou à Smiles. O Itaú
Unibanco decidiu fazer algumas alterações em seus programas. De um lado,
agilizou, os pontos são convertidos imediatamente e não levam mais um
período de dez dias, como era feito anteriormente.
Por outro lado, as
novas regras alteram a forma de pontuação: ao invés de converter cada
ponto adquirido em uma milha, agora o cliente precisa de 1,25 ponto do
cartão para convertê-lo em um ponto nos programas das companhias aéreas.
No Banco do Brasil, as regras também mudaram. Desde o ano passado, o
cliente precisa ter um mínimo de 10.000 pontos para solicitar um resgate
para os programas das aéreas. Enquanto isso, o Santander passou a
exigir um valor mínimo de transferência para o primeiro resgate, mas os
demais são feitos livremente.
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