Juíza determina prazo e pode enquadrar chefe do Cenipa; Procuradoria quer documento para decidir inquérito do maior acidente aéreo do País
A juíza Paula Mantovani Avelino, da 1.ª Vara Federal Criminal de São Paulo, deu prazo de 48 horas para que o brigadeiro Jorge Kersul Filho, chefe do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), encaminhe cópia assinada e rubricada do relatório final sobre a tragédia do voo 3054 da TAM, sob pena de enquadrá-lo por crime desobediência.
O pedido atende a solicitação do procurador da República Rodrigo De Grandis, que aguarda o documento para decidir se oferece denúncia (acusação formal à Justiça), pede novas diligências ou arquiva o inquérito aberto pela Polícia Federal (PF) para apurar responsabilidades no maior acidente aéreo do País. O desastre ocorrido em 17 de julho de 2007 no Aeroporto de Congonhas, na zona sul de São Paulo, deixou 199 mortos.
A investigação da PF concluiu que os pilotos da TAM foram os únicos culpados pela tragédia.
O relatório do Cenipa, no entanto, indica que as dificuldades de operação em Congonhas, a pressão silenciosa da companhia aérea para que se evitasse pousar em aeroportos alternativos em dias de chuva, as condições meteorológicas adversas naquele dia e até a conjuntura da crise aérea tiveram influência negativa sobre a tripulação, que num descuido teria deixado de seguir o correto procedimento para o uso das manetes (espécie de aceleradores do avião).
Resistência. Os militares relutam em ceder relatórios para processos judiciais por entenderem que têm caráter exclusivamente preventivo, como pregam as entidades internacionais de investigação de acidentes aeronáuticos.
Para a juíza, no entanto, "o não atendimento da diligência, após decorrido lapso temporal tão extenso, configura resistência injustificada ao cumprimento de expressa ordem judicial, além de grave ofensa aos princípios constitucionais ordenadores da administração pública".
Em outubro do ano passado, a magistrada já havia fixado prazo de 30 dias para que o Cenipa apresentasse cópia do relatório final do acidente. Entretanto, o material juntado pelos militares ao processo teria vindo sem assinaturas ou rubricas dos responsáveis pela apuração. Em sua petição, De Grandis sustenta que, dessa forma, o documento não tem valor jurídico.
Procurado ontem, Kersul disse que não se opõe a entregar o relatório ao Ministério Público Federal (MPF). "Fiz contato com o gabinete do De Grandis na semana passada porque queria uma cópia do pedido dele, que até hoje não recebi", assinalou. "Não temos nada a esconder, mesmo porque está tudo no site do Cenipa."
Cremação. No mesmo despacho, a juíza deferiu pedido da família de Aline Monteiro Castigio, uma das vítimas da tragédia, para cremar fragmentos identificados recentemente pelo Instituto Médico-Legal (IML). Funcionária da TAM, a comissária de 28 anos embarcou no voo 3054 para voltar das férias no interior do Rio Grande do Sul.
O professor universitário Dário Scott foi o primeiro familiar de vítimas do voo 3054 a conseguir autorização judicial para exumar o corpo da filha única, Taís, de 14 anos. Logo após o acidente, ele sepultou fragmentos corporais no Cemitério da Lapa, na zona oeste de São Paulo. Em maio do ano passado, Scott foi informado pelo IML da descoberta de mais fragmentos.
A luta para exumar os despojos, reuni-los com os fragmentos do IML e fazer uma cerimônia de cremação durou quase um ano.
PARA LEMBRAR
Polícia indiciou ex-dirigentes
Em novembro de 2008, a Polícia Civil de São Paulo chegou a indiciar dez pessoas pelo acidente com o Airbus A320 da TAM, entre eles os ex-presidentes da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) Milton Zuanazzi e da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) José Carlos Pereira, além de funcionários da TAM. Menos de uma semana depois, a medida foi suspensa por ordem da Justiça Estadual. Como a PF ainda apurava o caso, haveria risco de duplo indiciamento.
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