Avião da Air France teve 'perda' e pilotos não recuperaram, aponta o BEA.
Airbus nega relação de revisão de emergência com acidente de 2009.
Um ano após o avião que fazia o voo AF 447 cair no Oceano Atlântico em 1º de junho de 2009, deixando 228 mortos, a Airbus enviou um comunicado aos usuários de suas aeronaves recomendando que os pilotos tivessem conhecimento dos procedimentos de emergência para recuperação de estol (perda de sustentação). O G1 teve acesso ao “Temporary Revision nº 727-1”, expedido em maio de 2010 pela Airbus aos operadores. O documento, de acesso restrito, tem como título “stall recovery procedure” (procedimentos de recuperação de estol) e é válido para todos modelos de Airbus.
Em maio deste ano, dois anos após a tragédia e após a localização das caixas-pretas, o Escritório de Investigação e Análises (BEA) divulgou em relatório preliminar que o Airbus A-330 da Air France sofreu estol, afirmando que “o alarme de perda soou e o avião entrou em perda”. Especialistas e técnicos em investigação de acidentes aéreos apontam que o acidente ocorreu porque os pilotos não conseguiram entender corretamente o alarme e reverter a perda de sustentação.
Em entrevista ao G1, o porta-voz da Airbus, Clay McConell, negou que o alerta da fabricante tenha relação com o acidente da Air France. Segundo ele, a decisão de emitir um comunicado de procedimentos de emergência para recuperação de estol foi compartilhada com outras fabricantes de aeronaves.
“Eu não concordo que nós nunca recomendamos o treinamento de estol, isso não é verdade. Outras indústrias, incluindo Bombardier, Embraer, se uniram em um esforço conjunto (em 2010) para fazer uma recomendação adicional de treinamento de estol”, disse McConell.
Segundo ele, “houve consenso” entre as fabricantes de que era necessária uma nova recomendação após “alguns acidentes” envolvendo estol de aeronaves em baixa altitude na França e nos Estados Unidos. “Várias indústrias resolveram participar e fazer uma recomendação adicional e específica de treinamento de estol. Isso é conseqüência de um número de incidentes que ocorreram a baixa altitude, e não a alta altitude, como o acidente da Air France”, afirmou McConell, que é vice-presidente de comunicação da Airbus.
“A norma (publicada) é para eventos de baixa altitude. Não tem relação com o acidente da Air France”, diz McConell. “O BEA ainda investiga o acidente e não há ainda uma conclusão especificamente comprovada sobre isso (estol) como a causa".
O “Temporary Revision nº 727-1” ensina aos pilotos procedimentos para recuperação estol de aeronave “assim que houver qualquer sinal de indicação de estol”, sem especificar altitude.
O G1 entrou em contato com as fabricantes de aeronaves e elas negaram uma recomendação conjunta em 2010 sobre o estol. A Embraer disse que não emitiu nenhum procedimento de emergência sobre o tema no ano passado. Já a Bombardier diz que os manuais das aeronaves compreendem o tema e que "não comenta a questão". A Boeing não respondeu se emitiu alertas adicionais em 2010, afirmou apenas que “o assunto é muito delicado” e não voltou a responder aos questionamentos da reportagem.
Segundo a Airbus, um gerente do órgão que regulamenta a aviação civil nos EUA, a Administração Federal de Aviação (FAA), enviou a representantes de indústrias aeronáuticas um convite para integrar um grupo de trabalho que iria discutir treinamento, testes e verificações de estol de aeronaves. A assessoria da Airbus não diz quando o e-mail foi enviado, apontando apenas que o grupo deveria publicar novas recomendações em 1º de outubro de 2010, mas que a Airbus "se adiantou" e emitiu texto sobre procedimentos de emergência em maio daquele ano.
“Recuperação de estol faz parte do treinamento básico dos pilotos desde o início da aviação. A Airbus e todas as construtoras e companhias aéreas treinam isso sem exceção. Faz parte do treinamento”, diz McConell.
“A aplicação de mais velocidade, de mais potência no motor, em baixa altitude, tem sentido. Em alta altitude, recomendações adicionais de potência teriam impacto insignificante, efeito insignificante. A recomendação para estol de alta altitude não mudou”, acrescentou ele.
Questionado sobre se o BEA concluir que o estol interferiu no acidente a Airbus emitirá um novo alerta sobre emergência, o porta-voz disse que é cedo para falar sobre isso.
Recuperação de estol
Pilotos de Airbus de três companhias aéreas brasileiras relataram que não faziam treinamento de recuperação de estol até o procedimento ter sido recomendado pela fabricante pelo “Temporary Revision nº 727-1”. Questionada sobre se seus pilotos fazem este treinamento, a Air France não se manifestou.
Pelo texto divulgado pela Airbus, o procedimento operacional padrão, adotado frente ao reconhecimento de qualquer indicação de estol, é desligar o piloto automático e colocar o nariz da aeronave para baixo, reduzindo o ângulo de ataque, para recuperar a sustentação. O procedimento foi confirmado pela Airbus em e-mail de questionamento da reportagem.
Conforme o relatório do BEA, o piloto no comando do Air France que caiu no mar adotou procedimento diferente. “As ordens do piloto foram sempre de principalmente elevar o nariz” e, “a aeronave caiu durante 3 minutos e 3 segundos, durante o qual a aeronave permaneceu em situação de perda de sustentação (estol)", afirmou o BEA em seu relatório preliminar.
g1
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