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sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Planalto admite:vôo de Lulinha não tem amparo legal

Ao pegar carona, junto com 15 acompanhantes, num Boeing da FAB, Fábio Luiz Lula da Silva, filho do presidente, embarcou numa ilegalidade.

A Presidência da República reconhece que não há na legislação em vigor um mísero artigo que dê respaldo ao vôo.

A despeito disso, o Planalto considerou “normal” a carona. Invoca um argumento extralegal: o costume.

Eis o teor da manifestação oficial da secretaria de Imprensa do Palácio do Planalto:

“A possibilidade de o presidente da República convidar pessoas para deslocamentos em aviões oficiais baseia-se numa prerrogativa tradicionalmente exercida no Brasil: foi assim em governos anteriores, tem sido assim no atual”.

Deve-se à repórter Kátia Brasil a notícia sobre a apropriação privada das asas da FAB por Lulinha, como é conhecido o filho do presidente.

O primeiro-filho e seus acompanhantes serviram-se do Boeing da FAB em 9 de outubro. Voaram de São Paulo para Brasília.

As circunstâncias do vôo conferem ao caso um quê de extravagância. O Boeing foi deslocado em pleno ar. Estava a dez minutos de pousar em Brasília. Transportava militares recolhidos no interior de São Paulo.

Súbito, o comandante da aeronave recebeu ordem para retornar a São Paulo. Oficialmente, buscaria o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.

O avião pousou em Cumbica, no município de Guarulhos. Foi reabastecido. Descobriu-se que Meirelles e os caronas se encontravam em Congonhas.

Nova decolagem, seguida de uma hora de sobrevôo, para gastar o combustível. Aterrissagem em Congonhas. Embarque coletivo.

Meirelles mandou dizer que não sabia que Lulinha e comitiva dividiriam com ele os assentos do Boeing. A Aeronáutica disse que não dispunha da lista de passageiros.

Agora, o reconhecimento oficial de que o avião da FAB voou à margem da lei, equilibrando-se apenas nos velhos costumes.

Os vôos da Força Aérea estão regulamentados num decreto. Leva o número 4.244. Foi editado em 2002, sob Fernando Henrique Cardoso.

A normatização foi feita nas pegadas de uma anomalia. Descobrira-se que sete autoridades haviam como que “privatizado” as asas da FAB.

Usaram aviões da Viúva para realizar viagens de turismo. A maior parte delas para a aprazível ilha de Fernando de Noronha.

Afora os familiares, o rol de passageiros incluía seis ministros: Ronaldo Sardenberg, Pedro Malan, Paulo Renato, Sérgio Amaral, Raul Jungmann e Alberto Cardoso.

Além dos ministros, voara de FAB, a passeio, o procurador-geral da República de então, Geraldo Brindeiro. O PT, então uma aguerrida legenda de oposição, fez barulho inaudito.

Um dos ministros, Ronaldo Sardenberg, chegou a arrostar uma condenação judicial. A sentença seria anulada, porém, no STF. Decisão do presidente do tribunal, Nelson Jobim, hoje ministro da Defesa, a pasta que manda na FAB.

O que diz o decreto 4.244? Afora o presidente, só podem requisitar aviões da FAB ministros, presidentes da Câmara e do Senado, presidente do STF e comandantes militares. A requisição é admitida em três circunstâncias:

1. “Por motivo de segurança e emergência médica”.

2. “Em viagens a serviço”.

3. Nos “deslocamentos para o local de residência permanente”.

O decreto anota: “As autoridades [...] informarão a situação da viagem e a quantidade de pessoas que eventualmente as acompanharão“.

Ficou entendido que os acompanhantes eventuais deveriam ter relação com a segurança, a emergência médica ou a missão de serviço.

No vôo do dia 9 de outubro, a única autoridade presente no Boeing era Henrique Meirelles, que nem sequer sabia da companhia ilustre de que desfrutaria.

Ao invocar a tradição para qualificar de “normal” a carona de Lulinha, a assessoria de Lula arrasta para a encrenca uma filha de FHC, Luciana Cardoso.

Secretária pessoal do pai-presidente, Luciana utilizou-se de uma aeronave da FAB (modelo Xingu), para viajar de Brasília até Buritis (MG), em março de 2002.

Luciana foi à fazenda Córrego da Ponte. Uma propriedade dos Cardoso, que havia sido invadida por militantes do MST.

Alegou-se que era preciso inventariar os estragos. O Ministério Público abriu um inquérito. Mexe daqui, esquadrinha dali, a coisa foi ao arquivo.

Sob Lula, um novo episódio: em fevereiro de 2004, José Viegas, à época ministro da Defesa, voou de FAB, para fazer turismo com a família no Pantanal. O caso foi à Comissão de Ética Pública da Presidência. Deu em nada.

Noves fora um pedido de informações da Comissão de Fiscalização da Câmara, não há, por ora, vestígio de ação contra a carona de Lulinha.

Se vier, será perda de tempo. Como diz a assessoria de Lula, “foi assim em governos anteriores, tem sido assim no atual”. Às favas o contribuinte.

Correio do Povo

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