A empresa norte-americana Boeing, que concorre no programa F-X2 da Força Aérea Brasileira (FAB) com o caça F/A-18 Super Hornet, considera que está mais na disputa do que nunca. Segundo o vice-presidente da Boeing para o programa F-18, Bob Gower, a última oferta, apresentada ao governo brasileiro em 2 de agosto, traz argumentos "muito convincentes", como um preço até 40% menor que a da francesa Dassault, que participa da competição com o Rafale, e a transferência de "toda a tecnologia pedida pela FAB". "Acredito que seríamos até 40% mais baratos que o Rafale tanto nos custos de aquisição como de manutenção", revelou Gower em entrevista ao Correio.
O representante da Boeing, que se reuniu com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, nesta semana, questionou a "transferência de tecnologia irrestrita" oferecida pelo governo francês. "Para nós, isso significa ofertar tudo o que é preciso para projetar e construir uma aeronave. Eles possuem, por exemplo, os direitos do chip da Intel, que está dentro da plataforma do avião?", indagou.
Quanto à outra concorrente, a sueca Saab, Gower alertou para o fato de o Gripen NG ainda ser um avião em desenvolvimento, e de os custos e prazos para entrega, nestes casos, sempre serem maiores do que o estimado. Sobre a recente ofensiva da Saab no Brasil — que, nos últimos dez dias, teve uma audiência pública no Senado, convocou uma coletiva de imprensa e tem publicado anúncios do Gripen NG em jornais brasileiros —, Gower ironizou: "Alguns concorrentes estão mais desesperados por uma venda, porque sem uma venda, eles (os aviões) potencialmente não existem."
Em visita à Suécia, nesta semana, o presidente Lula disse que a única proposta que ele conhece "textualmente" é a da Dassault, entregue pelo presidente Nicolas Sarkozy. Isto torna a disputa desigual?
Acredito que seremos tratados de maneira justa na concorrência. O nosso entendimento é que a Força Aérea Brasileira ainda está avaliando todas as três propostas, e levará suas recomendações ao ministro Nelson Jobim e ao presidente Lula. E quando isso acontecer, o presidente Lula poderá ter acesso a todas as propostas, já com as recomendações da FAB. No caso da Boeing, usamos este período a mais para atualizar a nossa proposta e acreditamos que, com essa nova oferta, a decisão pode se voltar a nosso favor. Temos argumentos muito convincentes sobre a mesa, considerando que a nossa proposta sairá muito mais barata ao governo brasileiro do que a do Rafale e o nosso programa de transferência de tecnologia.
Quão mais barato é o Super Hornet, comparado ao Rafale?
Acredito que seríamos até 40% mais baratos que o Rafale tanto nos custos de aquisição como de manutenção.
A Saab chegou a dizer que, em 40 anos, o custo de um caça como o Super Hornet ou o Rafale equivaleria ao de dois Gripen NG. No fator custo, não seria mais interessante para o Brasil investir então na proposta sueca?
É preciso observar que, hoje, o Gripen NG não é um avião pronto, então qualquer projeção que se faça sobre o Gripen NG não tem base em uma trajetória, como é o caso do Super Hornet, que já teve 400 unidades entregues. Além disso, a nossa experiência com o desenvolvimento de aviões, como o 787 e o Joint Strike Fighter, mostra que os custos sempre acabam sendo bem mais altos do que o esperado e o prazo para entrega, maior. E esse é o grande risco de se pegar um programa que ainda está sendo desenvolvido.
O governo brasileiro, em especial o presidente Lula e o ministro Jobim têm afirmado, reiteradamente, desde o 7 de setembro, que o Brasil tem preferência política pela proposta francesa. Você acha que, com isso, o governo pula etapas no processo?
Tudo o que vimos até agora está de acordo com o processo original: a FAB está fazendo a sua avaliação, vai encaminhá-la ao Ministro da Defesa, que levará ao presidente. Então, todos os passos que o governo brasileiro afirmou que iria tomar, ele está tomando agora. E eu realmente acredito que o Brasil obteve, no último mês, uma vantagem, já que todas as concorrentes tiveram a oportunidade de melhorar as suas propostas, que agora estão mais competitivas.
Na última terça-feira, o senhor se reuniu com o ministro Jobim. Como foi o encontro? O senhor obteve garantias sobre o processo?
Foi um encontro muito bom. Tive a oportunidade de explicar o que significa o termo "necessário" quando falamos de transferência de tecnologia, e ele me garantiu que a competição ainda está aberta para os três concorrentes, o que dá muita segurança. Também foi muito importante porque queríamos ter a certeza de que todos no processo estão informados sobre o que está na nossa proposta para fazer a melhor escolha para o Brasil.
O que a Boeing melhorou na sua proposta?
A principal mudança é a possibilidade de finalizar os caças aqui. Nós já tínhamos oferecido fazer uma parte significante da fuselagem, assim como as asas, mas agora temos a oportunidade de entregar os caças a partir do Brasil. Outro ponto significante é que conseguimos, no início de setembro, a aprovação do Congresso para toda a tecnologia que foi oferecida. Então não precisamos nenhuma aprovação adicional à tecnologia que propomos transferir.
Mas o que, de fato, poderá ser produzido aqui?
A montagem final dos 24 últimos aviões será feito no Brasil. Isso inclui unir a fuselagem, as asas, colocar a cauda, instalar toda a aviônica (instrumentos de vôo) e testar o avião para ver se ele está pronto para voar. Mas mais do que isso, vamos fazer a frente da fuselagem e uma parte significativa das asas para as 36 aeronaves aqui. E esta fuselagem produzida aqui não será apenas para os caças vendidos ao Brasil, mas o país poderá produzir para qualquer outra venda internacional que fizermos. E uma parceria deste tipo com a indústria brasileira é muito interessante, já que temos um grande mercado internacional.
O garoto-propaganda dos caças franceses tem sido, desde o início, o presidente Nicolas Sarkozy, que veio pessoalmente ao Brasil em meio à concorrência. Vocês acreditam que faltou um pouco deste tipo de empenho do governo americano?
O governo americano respalda totalmente a oferta que foi feita ao Brasil. A venda do Super Hornet, inclusive, é uma venda de governo a governo, não é da Boeing ao Brasil. Toda a proposta passou pelo governo americano, que enviou ao Brasil assessores próximos ao presidente Barack Obama para reafirmar que Washington aprova a oferta e a transferência de tecnologia. Eles fizeram o que era preciso nesta campanha. Desde o início, o nosso foco tem sido em colocar o nosso compromisso no contrato, para não haver surpresas. Então o fato de alguém vir aqui e falar sobre compromissos é uma coisa; se preocupar em colocar isso no contrato é um outro patamar. O que assinamos, o que colocamos no contrato é mais importante do que o que um dignatário possa falar em um discurso. E essa é uma preocupação que a Boeing e o presidente Obama tem tido: colocar tudo por escrito.
Por conta da recente ofensiva do governo sueco, que tem vindo constantemente ao Brasil, alguns tem considerado apenas a Saab e a Dassault no páreo. Como você vê esta suposição?
Nós estamos muito mais na disputa do que antes, e a nossa proposta falará por si só. Nós estamos acompanhando a disputa de perto, estivemos aqui nos últimos dois dias. No entanto, alguns concorrentes estão mais desesperados por uma venda, porque sem uma venda, eles (os aviões) potencialmente não existem. Nós temos um negócio estável, e não estamos em pânico como eles aparentemente estão.
A França oferece transferência de tecnologia irrestrita, e os EUA, a transferência de tecnologia "necessária". O ministro Jobim inclusive já questionou este termo. O que é uma transferência de tecnologia "necessária"?
"Necessária" quer dizer que vamos transferir toda a tecnologia que foi pedida pela FAB. Honestamente, nós não conseguimos entender como alguém oferece transferência de tecnologia "irrestrita", porque, para nós, isso significa ofertar tudo o que é preciso para projetar e construir uma aeronave. Eles possuem, por exemplo, os direitos do chip da Intel, que está dentro da plataforma do avião? Eles estão oferecendo acesso a essa tecnologia? Nós não oferecemos transferência irrestrita porque não temos os direitos sobre os chips da Intel. Acho que essa é a diferença. O governo americano tem se preocupado em colocar tudo no contrato, porque assim, há a segurança de que será cumprido. Quando fica só nas palavras, pode até agradar, mas se não for colocado no papel, eu não acredito.
A Saab disse que ofereceu 175% do valor de seu pacote em contrapartidas comerciais e tecnológicas (offset) ao Brasil. O que a Boeing ofereceu, neste sentido, em sua última proposta?
Consideramos o nosso programa de offset muito completo, porque inclui não só a aeronave, mas coisas que extrapolam, como ajudar no desenvolvimento do KC-390 (futura aeronave de transporte militar da Embraer), e de um caça supersônico comercial. Estamos fazendo tudo isso para ajudar a indústria brasileira e dar acesso ao mercado americano, que é o maior mercado de Defesa do mundo — dez vezes maior que o Francês e 100 vezes maior que o da Suécia. É preciso destacar ainda que, até hoje, cumprimos com todos os nossos offsets — que somam mais de US$ 30 bilhões —, e todos dentro do prazo. Além disso, passadas as obrigações do offset, continuamos fazendo negócios com todas as empresas.
Na proposta de vocês, estão previstos o apoio e o co-desenvolvimento do KC-390. Mas o governo americano compraria este tipo de aeronave do Brasil, uma vez que já dispõem de aviões de transporte como o C-17 e C-130?
O foco inicial do co-desenvolvimento é pegar o que temos feito com a plataforma e a tecnologia do C-17 (produzido pela Boeing), e aplicar para reduzir os riscos no programa de desenvolvimento do KC-390. Os aviões C-17 e KC-390 são muito parecidos, mas o C-17 é muito maior. Hoje, o equivalente ao KC-390 nos EUA é o C-130, que é um modelo mais antigo, com menor velocidade e menor alcance. E a Boeing não tem aviões deste tipo do tamanho do KC-390, então nos interessa não só o mercado americano, mas de todo o mundo para esta aeronave — vai depender de o quanto a Embraer vai querer investir nestes mercados. É importante notar que os EUA tem buscado um substituto para o C-130, e, em conversas com a Força Aérea Americana, vimos que o KC-390 atende muito bem às expectativas. Mas isso é para daqui a sete anos.
A Embraer respondeu à primeira chamada da Força Aérea dos EUA para a compra de cem caças leves, concorrência que disputaria com o Super Tucano. O senhor acredita que isso pode influenciar na disputa do FX-2?
Para mim, é muito claro que se o Brasil mostrar que seu mercado de Defesa está aberto aos competidores americanos, isso vai ajudar a garantir que o mercado americano esteja também aberto às empresas brasileiras. Eu realmente acredito que um resultado do FX-2 para uma empresa americana pode aumentar muito as chances do Super Tucano nos EUA.
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sexta-feira, 9 de outubro de 2009
Boeing garante preço 40% menor que o Rafale
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