400 milhões de reais em sua propriedade rural
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| Wagner Canhedo: "Fazendeiros" são gigolôs de vaca. Minha fazenda é uma empresa" | 
           Na década de 90, enquanto a Vasp afundava em dívidas,                o empresário Wagner Canhedo montava a fazenda de criação                de gado mais bem equipada do Brasil. A Piratininga ocupa 215.000                hectares no extremo norte de Goiás, na divisa com o Tocantins,                uma área equivalente a quase o dobro da cidade do Rio de                Janeiro. O negócio começou relativamente modesto,                com 30.000 cabeças de gado. Nos                últimos anos evoluiu a uma velocidade espantosa para os padrões                desse tipo de empreendimento e hoje abriga um dos maiores rebanhos                concentrados em uma só fazenda do país, talvez do                mundo, estimado em 100.000 cabeças.                Para conseguir escoar sua produção, o empresário                comprou 30% de um dos maiores frigoríficos de Goiás                e mantém outra fazenda de engorda com 56.000                hectares. A Piratininga conta com uma infra-estrutura que não                existe em nenhuma outra fazenda desse tipo, pelo menos na América                Latina: uma rede de 3.600 quilômetros                de estradas que custou mais que todos os bois que existem na fazenda.                Em linha reta, elas cobrem a distância de Porto Alegre a Maceió.                Há também 304 pontes de concreto, dois viadutos e                100.000 metros quadrados de construções.                Para atender os 280 funcionários foi montada a estrutura                de uma pequena cidade: uma escola para setenta alunos, igreja para                150 pessoas, posto de saúde e um complexo poliesportivo com                duas piscinas. É um negócio de fazer inveja a muitas                cidades de verdade.               
 Segundo                os próprios cálculos de Canhedo, para transformar                a fazenda no colosso que ela é hoje foram gastos mais de                400 milhões de reais. Só a construção                das estradas, pontes, viadutos e prédios consumiu metade                desse dinheiro, informa o empresário. As terras, os animais                e as máquinas levaram a outra metade (veja quadro ao lado).                O dono da Vasp adora contar vantagem sobre sua fazenda. Diz que                já perdeu a conta de tudo que gastou lá. "Corrigindo                tudo direitinho, pode até ser muito, muito mais que esses                400 milhões tudo que gastei lá", diz orgulhosamente                Wagner Canhedo. Como sempre, deve estar inflando os números.                Mas, por maior que seja o exagero contábil do dono da Vasp,                a Piratininga é um projeto excepcional em sua categoria.                Ele investiu durante vinte anos ininterruptos na propriedade. Metade                da área onde está a Piratininga é de pântanos,                aterrados no decorrer dos anos. Essas obras foram tão grandes                que em 1996 a Secretaria de Meio Ambiente de Goiás mandou                Canhedo detalhá-las em um complexo relatório, por                temer que as escavações provocassem um desastre ambiental                na região. O projeto só começou a dar lucro                nos últimos quatro anos. De acordo com a contabilidade de                Canhedo, rende 10 milhões de reais por ano.
Segundo                os próprios cálculos de Canhedo, para transformar                a fazenda no colosso que ela é hoje foram gastos mais de                400 milhões de reais. Só a construção                das estradas, pontes, viadutos e prédios consumiu metade                desse dinheiro, informa o empresário. As terras, os animais                e as máquinas levaram a outra metade (veja quadro ao lado).                O dono da Vasp adora contar vantagem sobre sua fazenda. Diz que                já perdeu a conta de tudo que gastou lá. "Corrigindo                tudo direitinho, pode até ser muito, muito mais que esses                400 milhões tudo que gastei lá", diz orgulhosamente                Wagner Canhedo. Como sempre, deve estar inflando os números.                Mas, por maior que seja o exagero contábil do dono da Vasp,                a Piratininga é um projeto excepcional em sua categoria.                Ele investiu durante vinte anos ininterruptos na propriedade. Metade                da área onde está a Piratininga é de pântanos,                aterrados no decorrer dos anos. Essas obras foram tão grandes                que em 1996 a Secretaria de Meio Ambiente de Goiás mandou                Canhedo detalhá-las em um complexo relatório, por                temer que as escavações provocassem um desastre ambiental                na região. O projeto só começou a dar lucro                nos últimos quatro anos. De acordo com a contabilidade de                Canhedo, rende 10 milhões de reais por ano.               
                O que fez o empresário endividado gastar tanto em um empreendimento                que gera um retorno relativamente modesto é intrigante. As                maiores fortunas do país destinam parte de seu faturamento                para empreendimentos agrícolas de grande porte, é                verdade. O que chama a atenção em relação                a Canhedo é que o carro-chefe de seus negócios, a                Vasp, vai de mal a pior. Seus prejuízos triplicaram na última                década e a empresa acumulou uma dívida avaliada em                3,2 bilhões de reais. Mesmo assim, Canhedo conseguiu inserir                a Fazenda Piratininga na lista dos trinta maiores empreendimentos                agropecuários do Brasil. Sua explicação é                que o dinheiro saiu de velhas economias e do faturamento da própria                Piratininga. "A Vasp não tem nada a ver com a fazenda", diz.                De fato, quem só o conhece pelas dívidas de sua empresa                aérea se espanta em vê-lo falar da prosperidade de                seus negócios no campo. "Hoje eu não venderia essa                fazenda nem por mais de 1 bilhão de reais", afirma. Segundo                ele, o segredo da Piratininga é a boa administração.                "Os fazendeiros brasileiros são gigolôs de vaca, que                ficam esperando ela dar o bezerro. Minha fazenda funciona como uma                empresa." 
       
       
         
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| O complexo de casas da família: muros altos e duas piscinas | 
Não                é bem assim. O próprio Canhedo se enrola e admite                que o negócio lhe custou dezesseis anos de investimentos                antes de dar lucro. Além disso, grande parte das benfeitorias                mais caras da propriedade foi introduzida depois que ele comprou                a Vasp, uma empresa que deve muito dinheiro ao governo. Em 1992,                quando ele já controlava a companhia aérea, a Piratininga                tinha 1.069 quilômetros de estradas,                1.447 quilômetros de cercas, 72.000                hectares de pastos e nenhum viaduto, segundo aponta um laudo técnico                da Polícia Federal. Um ano atrás, em uma vistoria                realizada pela Procuradoria Geral do Estado de São Paulo,                os auditores encontraram uma situação bastante diferente.                Pelo que eles conseguiram encontrar, a malha de estradas havia quase                duplicado, a área cercada triplicou e a de pastagens aumentou                60%. Só a partir de 1994 foram construídos dois viadutos                de 50 metros cada, avaliados em 80.000                reais, um tipo de luxo que não se vê em nenhum imóvel                desse tipo. Segundo Canhedo, muita coisa ficou fora da conta dos                auditores. Fazendas de gado são lugares despojados ao extremo                porque a margem de lucro do negócio é muito pequena.                A maior criação de gado em uma única propriedade                do mundo, a Fazenda Agroflora, que fica na Venezuela, tem área                duas vezes maior do que a da Piratininga e um rebanho de 160.000                cabeças. Lá, existem apenas 500 quilômetros                de estradas. "Não podemos sofisticar a produção                porque a pecuária não é um negócio de                alta rentabilidade", diz Samir Jubran, dono de 150.000                cabeças de gado em onze fazendas espalhadas pelo Brasil.                
       
       
         
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| Um dos 26 currais, na sede da Piratininga: total de 100 000 bois | 
Mas                o que teria levado Canhedo a despejar rios de dinheiro ali? A explicação                pode remontar ao nebuloso episódio que transferiu para o                empresário o controle da Vasp. Naquela ocasião, o                governo do Estado de São Paulo superavaliou a fazenda de                modo exorbitante. Um laudo técnico produzido em 1990 concluiu                que o valor da Piratininga era de 560 milhões de dólares,                dez vezes seu preço real na época, segundo especialistas.                Foi com base nesse documento que o governo aceitou a hipoteca da                fazenda como garantia de que Canhedo pagaria as dívidas da                Vasp. Como se sabe, ele nunca pagou dívida alguma e os bancos                jamais conseguiram tirar-lhe a fazenda. Desse modo, a Piratininga                vale muito mais no papel do que no mercado. Segundo pecuaristas                experientes e corretores de imóveis rurais, a Piratininga,                na verdade, é um mico. Tudo teria sido erguido só                para impressionar. Sua enorme malha viária, pontes e construções                aumentam enormemente os custos de manutenção. Muitos                especialistas do ramo duvidam que Canhedo consiga realmente tirar                algum dinheiro dali. Para o consultor Victor Abou Nehmi Filho, que                presta serviços para alguns dos maiores pecuaristas do país,                "um negócio daquele é completamente inviável.                Os custos devem ser exorbitantes". 
       
       
         
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| Os sete galpões da Piratininga: abrigo para mais de sessenta máquinas agrícolas | 
Advogados                com experiência nesse tipo de operação dizem                que, perante tribunais e bancos, não existe um bem mais precioso                do que terras. Uma propriedade é um trunfo poderoso na mesa                de negociação. Quanto mais impressionante, maior seu                valor. Diferentemente de outros tipos de bens, uma propriedade não                se consome, não desaparece nunca, não pode ser roubada                e não pode falir por causa de má administração.                A fazenda é a garantia principal oferecida por Canhedo para                praticamente toda a sua dívida. Sem a fazenda ele provavelmente                jamais teria comprado a Vasp. Ela foi usada mais de uma vez em garantia                de empréstimos que o empresário tomou em bancos do                governo. O detalhe é que nunca ninguém conseguiu checar                quanto a propriedade realmente vale. Alcio Portela, um ex-diretor                do Banco do Brasil contratado por Canhedo para negociar suas dívidas                junto à instituição, disse que foi graças                à posse da Piratininga que o dono da Vasp sempre conseguiu                obter novos empréstimos. O Banco do Brasil tentou cobrar                as dívidas em três ocasiões. Nas três,                o prazo de pagamento foi ampliado. 
       
       
         
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| A Piratininga, de Wagner Canhedo: sede de luxo e hangar para dois aviões | 
Enquanto as dívidas vão sendo prorrogadas, Canhedo continua gastando. "Precisamos abrir mais uns 500 quilômetros de estradas nos próximos dez anos, e ainda faltam cerca de cinqüenta pontes, que estamos sempre construindo", diz. Ele vai à Piratininga todos os finais de semana em um de seus aviões particulares para supervisionar as obras. Uma vez por mês aterrissa com uma maleta cheia de dinheiro para fazer o pagamento dos funcionários. No final de abril, uma quadrilha invadiu a fazenda, uma fortaleza onde a entrada é permitida somente com a autorização do próprio Canhedo, e roubou do cofre do escritório 136.000 reais destinados aos pagamentos. Freqüentemente o empresário convida seus amigos deputados e senadores para pescar nos rios (quatro cruzam a área) e lagos (mais de 100) dentro da fazenda. Em São Miguel do Araguaia, município de Goiás onde está localizada a Piratininga, o empresário é festejado. Ajudou a reformar a cadeia pública e emprestou suas máquinas para a construção da praça principal, que tem uma placa de agradecimento com seu nome.
O incrível sistema viário de Canhedo
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| Uma das 304 pontes: nas fazendas vizinhas, são de madeira | Um viaduto no meio do nada: só para passar a boiada | 
O                      maior patrimônio da Piratininga não está                      nas terras e nos bois, como é comum nesse tipo de propriedade,                      mas em seu inacreditável sistema viário. Além                      das estradas, há mais de 300 pontes de concreto que                      atravessam os quatro rios que cortam a fazenda. Dois viadutos                      completam a exótica paisagem rural construída                      por Wagner Canhedo.
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